quarta-feira, 31 de julho de 2013

terça-feira, 30 de julho de 2013

AR DE ROCK - banca na feira da ladra - LISBOA


Rui veloso - Carlos Tê – sei de uma camponesa

Sei de uma camponesa, Sem campo, sem quintal, Que canta debruçada ao sol da seara, Trigo da cara, de suor tão debulhada... Sei de uma camponesa, Dança à noite na eira, Perfumada de avenca e feno, enfeitada de tomilho, Canta com a expressão de quem vai ter um filho, Mesmo pelo coração ... Sei de uma camponesa, Nunca enche esta cidade, Nunca se senta à minha mesa, nunca me leva à sua herdade Pr'ouvir um trocadilho, pr'a tornar realidade Um sonho que perfilho.

segunda-feira, 29 de julho de 2013

A BAÍA DE CASCAIS


A Baía de Cascais - Delfins
Na baía de Cascais
Avistei ao longe um barco a arder
Perguntaste porque o sonhava
Olhei ao céu, não pude responder
Vejo o mar nos teus olhos
Ao contar-te velhos quadros
Das viagens, que o mar soube esconder
Eu pinto esta baía assim
E são mil cores ao pé de mim
Nesta baía eu descobri
Tantas imagens perto de mim
Só, no cais
Vou recordar esse teu olhar
à deriva no mar
Lembro o mar nos teus olhos
Ao deixar neste quadro
a saudade, depois de te perder
Eu pinto esta baía assim
E são mil cores ao pé de mim
Nesta baía eu descobri
Tantas imagens perto de mim

domingo, 28 de julho de 2013

ALVORADA


Nasce mais um dia
contas infinitas de pedaços de tempo
minúsculos

as montanhas obedecem à luz do astro rei
cumprimentam a aurora
descansam do passeio eterno
crescem na lentidão destes nascimentos repetidos
cumprem

as montanhas da tradição
desenhadas pela paisagem
resistem ao fogo
ao gelo
às intempéries
às neblinas escuras que as escondem
em certas alvoradas

as montanhas
obedientes
são como corações perdidos
contas infinitas de pedaços de tempo
minúsculos

resistentes

sábado, 27 de julho de 2013

JAZZ no QUEBRA


Jazz Improviso (Poema)
Silas Corrêa Leite

Os melhores livros ainda não foram escritos
Os melhores dramas jamais foram filmados
Os melhores santos são todos malditos
Os melhores jogos ainda não são jogados
Os melhores instrumentos ainda não foram soados
Os melhores poetas não foram devidamente drenados
Ai de ti poeta em seu estágio de proscrito
A melhor luz ainda não raiou no infinito
Todos os livros são olhos furados
Todos os filmes são falsos editados
Todos os santos são pecadores cruzados
Todos os jogos foram valores violados
Que livro ainda será escrito um dia
Que filme incompreensível será censurado
Que santidade na podridão humana haveria
Se tudo é jogo de cena num campo minado
Livros filmes dramas músicas jogos santos – Vaidades
Ainda não se abriram as páginas das celestidades
Somos todos falsos santos fílmicos cênicos alienados letrais
Todos os pobres homens finitos carpindo seus malditos ais!



Silas Corrêa Leite- Nascido no bairro de Harmonia, Monte Alegre (hoje Telêmaco Borba) Paraná, criado na Estância Boêmia de Itararé-SP, residente em Sampa 451 Anos Blues. Autor de Portas-Lapsos, Poemas, 2005, Editora All-Print, Série Literatura Brasileira Contemporânea – CAMPO DE TRIGO COM CORVOS, Editora Design
(Texto da Série ERAM OS DEUSES CORINTHIANOS?)

sexta-feira, 26 de julho de 2013

A VELHA CASA - ARRUINADOS II - Verride


Os escombros da velha casa,
Não são só os escombros da velha casa,
São as muitas sobras da velha casa,
Do tempo em que vivi na velha casa,
E vi se construir a velha casa,
E vi sorrir a velha casa,
Quando na entrada da velha casa,
A despedida na velha casa,
Dos muitos móveis da velha casa,
Me vi morrer na velha casa,
Me vi fugir p'ra velha casa,
Desespero nas paredes da velha casa,
Muitos gemidos já ouviu a velha casa,
Muitas lágrimas já tocaram a velha casa,
Muitos amores entraram e saíram da velha casa,
Por que foi desmoronar logo a velha casa?
Quão duro foi por de pé a velha casa?
E simplesmente caiu a velha casa,
E meus sonhos na velha casa,
E minha história na velha casa,
Já são tão velhos e mortos quanto a velha casa!

Rennan Silva in http://sitedepoesias.com/poesias/36586
17/12/2008

quinta-feira, 25 de julho de 2013

TROPICAL

Este poema fez tanta parte da minha vida, quando a minha casa ainda estava no meu amor...

Regresso devagar ao teu
sorriso como quem volta a casa. Faço de conta que
não é nada comigo. Distraído percorro
o caminho familiar da saudade,
pequeninas coisas me prendem,
uma tarde num café, um livro. Devagar
te amo e às vezes depressa,
meu amor, e às vezes faço coisas que não devo,
regresso devagar a tua casa,
compro um livro, entro no
amor como em casa.

Manuel António Pina, in "Ainda não é o Fim nem o Princípio do Mundo. Calma é Apenas um Pouco Tarde" 

quarta-feira, 24 de julho de 2013

SABEDORIA - Igreja de São Tiago - Coimbra


Ainda não és sábio

Entendes
o prazer que se estende para lá de ti
em toda a parte
sob todas as formas
está longe
tão longe da sabedoria
como da verdadeira alegria

Entendes
o que se estende para lá de ti
que vive autêntico
talhado na pedra
na base
no fuste
no românico capitel ornamentado
está longe
tão longe de ti

tranquilo e imperturbável 

terça-feira, 23 de julho de 2013

... E SEM PALAVRAS ...


O dia está claro
porque está tão escuro

O dia está azul
porque está tão negro

As árvores divertem-se
porque não me divirto
e estou tão escuro
e negro
e sem palavras

O pincel destapa milhares de pássaros
a esvoaçar por sobre a densa floresta
num dia azul

O pincel destapa as nuvens cinzentas
carregadas de água e sofrimento

O pincel destapa as árvores
que já não se divertem
despidas

e eu continuo eu
escuro
e negro

e sem palavras...

segunda-feira, 22 de julho de 2013

ESTÁTUAS DE CHUMBO


Imagina
não desce as escadas
mantém-se no pátio superior
expectante

O que estará para lá do salto que não pratica
O que se estende no escuro que habita o fundo da escadaria gigantesca

Procura
as asas no vento do fim de tarde

Folheia
as páginas carregadas de frases de uma história que nada lhe diz

O tempo custa a passar
O Pátio transforma os pés
em estátuas de chumbo


domingo, 21 de julho de 2013

O LABIRINTO BUCÓLICO


Labirinto bucólico
brilha vaidoso pela dificuldade inesperada
que coloca a quem o enfrenta
Sebes gigantescas escondem o outro lado
o beco sem saída
denso
Semeia no jogador a esperança
de alcançar a saída
vitorioso

Prende o invasor nas suas entranhas bucólicas
O Labirinto é um monstro
de folhas secas e quebradiças
de onde nenhum aventureiro
conseguiu escapar

O pai morreu
A mãe está doente
não tem irmãos, primos, parentes
entrega-se ao abraço desafiador
do Labirinto bucólico
para não mais voltar

sábado, 20 de julho de 2013

FINALMENTE O PÁSSARO ENTENDE


Enquanto aguarda
a Árvore não fala
deixa recados nos troncos
nas folhas
por entre os ramos
morre de pé mais um pedaço

Avisa
aperta as raízes com mais vigor
abraça a terra profunda
enquanto aguarda
morre de pé
mais um pedaço
e finalmente o pássaro
entende

sexta-feira, 19 de julho de 2013

O SILÊNCIO DOS PROFETAS


Pelo centro da folha risco
a melodia de palavras inúteis
todas as palavras são inúteis
todos os poetas são inúteis

Os dias e as noites
as tardes e as alvoradas
os ritmos compassados
a que tudo acontece
com precisão matemática
ajustada ao mais inacreditável instante
de pureza inútil
pois tudo é inútil
como as palavras
os poetas
os dias
as tardes
as alvoradas

Os profetas não são inúteis
os profetas são os únicos que não são inúteis
essas bestas sabem de tudo
e calam-se
não vá alguém compreendê-los

Os profetas não são inúteis
protegem-se
protegem os seus
da inutilidade do que é
ser outra coisa qualquer
que não um profeta

A beleza é inútil
(e) atrapalha
torna ainda mais inúteis
todos os que lhe caem nas teias

Um profeta resolveu comunicar a um inútil
uma verdade insofismável
o inútil riu-se
chamou-o lunático
poeta
sonhador
todos os nomes inúteis
uma corja de inúteis
um bando de cretinos inúteis
como as palavras de todos os poetas

Inutilidade das palavras
futilidade dos sonhos
nada importa
só aquilo que não é inútil
só aquilo que os profetas sabem
e escondem
para se defenderem

Pelo centro da folha
risco palavras inúteis
todas as palavras passaram a ser inúteis
ao contrário do que deveria acontecer

Fútil
Inútil
Fúteis
Inúteis

Todas as palavras de todos os poemas
acontecidos e por acontecer
Os mundos deixaram de ser redondos
Passaram a ser tão inúteis
como os sonhos

Escondi as palavras no meio desta folha
dobrada em quatro páginas inúteis
se as esconder serei profeta
defenderei a minha glória
inútil
Não serei fútil

Se todos os sonhos
contidos em todas as frases
construídas por palavras fúteis
deixarem de acontecer
o silêncio dos profetas
será respeitado
será a única coisa não inútil
não fútil

Apesar de serem esses profetas
as maiores bestas
que o mundo novo
não fútil
composto por milhões de arestas
se encarregou de parir


quinta-feira, 18 de julho de 2013

NÃO MAIS QUERO ACORDAR


Repetir o encontro
pensamento delicado
revejo o teu rosto
escuto as tuas palavras
o batimento do teu coração

Escondidos na floresta dos desejos
os caprichos estão à solta
correm em liberdade
são poemas
sem corpo nem saudade

Bálsamo
sonho corajoso
irreprimível

Troncos fortes
ramos poderosos
onde apenas a luz da lua se atreve a chegar
a galope
para nos abraçar

não mais quero acordar


quarta-feira, 17 de julho de 2013

A LUZ ILUMINA


A pulga
invadiu o espaço fechado
onde só o inseto penetra
Joga solitária a passagem do tempo
no calor do pêlo do animal

Passeio as mãos pelas tuas pernas
na canela lisa
junto aos joelhos

O sol tem um rosto a estas horas
sorri
queima o inseto saltador
arde
junto aos joelhos

o calor deixa cair os gestos defensivos
onde só o coração penetra
a luz ilumina


terça-feira, 16 de julho de 2013

DO TAMANHO DO MUNDO MAIS PEQUENO


Inoperância
Testemunho
Raciocínio
Tátil, inoportuno, sereno
do tamanho do mundo mais pequeno

Inusitado
Parasita
Molecular
Desenfreado
Cospe violento
Morde violento
nas marés recheadas de fome
do tamanho do mundo mais pequeno

Guerras inusitadas surgem
rompem
deflagram por todo o lado
por toda a parte
Semeadas pela inoperância do raciocínio

Ignóbil
Sereno
do tamanho do mundo mais pequeno


segunda-feira, 15 de julho de 2013

DIA DE ANIVERSÁRIO


O Pássaro chegou com a manhã
madrugador
tudo está tão igual
tudo está tão igual e tão errado

Encontrei o chilrear que o pássaro perdera
no último Outono quando partiu
nenhum vento, brisa, suspiro, cadência
nenhum som
nenhum sinal

Devolvi o chilrear que o pássaro perdera
cansado

O pássaro madrugador agradeceu
logo recomeçou a cantar
serenando o meu dilúvio
madrugador

domingo, 14 de julho de 2013

REAL REPUBLICA DO DEUZ-DARAH


Deus é um cara gozador
Adora brincadeira
Pois pra me jogar no mundo
Tinha o mundo inteiro
Mas achou muito engraçado me botar cabreiro
Na barriga da miséria
Nasci brasileiro
Eu sou do Rio de Janeiro
Diz que deu
Dia que dá
Diz que Deus dará
Não vou duvidar, ó nega
E se Deus não dá
Como é que vai ficar, ó nega?
"à Deus dará", "à Deus dará"
Diz que deu
Diz que dá
Diz que Deus dará
Não vou duvidar, ó nega
E se Deus negar
Eu vo me indignar e chega
Deus dará, Deus dará
Jesus Cristo ainda me paga, um dia ainda me explica
Como é que pôs no mundo essa pobre titica
Vou correr o mundo afora, dar uma canjica
Pra ver se alguém se embala ao ronco da cuíca
Aquele abraço pra quem fica, meu irmão
Deu, dá, dará
Não vou duvidar, ó nega
E se Deus negar
Como é que vai ficar, ó nega?
"à Deus dará", "à Deus dará"
Diz que deu
Diz que dá
Diz que Deus dará
Não vou duvidar, ó nega
E se Deus negar,
Eu vo me indignar e chega
Deus dará
Deus dará
Deus me deu mãos de veludo pra fazer carícia
Deus me deu muitas saudades e muita preguiça
Deus me deu pernas compridas e muita malícia
Pra correr atrás de bola e fugir da polícia
Um dia ainda sou notícia (Se liga aí,hein)
Dará
Não vou duvidar, ó nega
E se Deus não dá
Como é que vai ficar, ó nega?
"à Deus dará", "á Deus dará"
Diz que deu
Diz que dá
Diz que Deus dará
Não vou duvidar, ó nega
E se Deus negar
Eu vo me indignar e chega
Deus dará
Deus dará
Deus me fez um cara fraco, desdentado e feio
Pele e osso simplesmente, quase sem recheio
Mas se alguém me desafia e bota a mãe no meio
Eu dou porrada à 3x4 e nem me despenteio
Porque eu já tô de saco cheio.
CÁSSIA ELLER - Partido Alto

sexta-feira, 12 de julho de 2013

quarta-feira, 10 de julho de 2013

terça-feira, 9 de julho de 2013

AMAR


Amar

Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer,
amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?

Que pode, pergunto, o ser amoroso,
sozinho, em rotação universal, senão
rodar também, e amar?
amar o que o mar traz à praia,
e o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?

Amar solenemente as palmas do deserto,
o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o áspero,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave de rapina.

Este o nosso destino: amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.

Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa
amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita.

Carlos Drummond de Andrade

segunda-feira, 8 de julho de 2013

PRAÇA DO COMÉRCIO - Coimbra


Casas do fim do dia solarengo
Saudade da sua beleza que me cansa
e me mente
e se mantém sempre serena
como se tivesse acabado de acordar

E as palavras todas que ficaram por dizer
transbordaram
no meio da praça
onde estas casas me mentem
e o resto do mundo é apenas figurante
desta cena

onde penteias os cabelos com os dedos
e sorris envergonhada
... nada
só te estou admirando
como se tivesse acabado de acordar

domingo, 7 de julho de 2013

A CARROÇA VAZIA


A Carroça Vazia

Certa manhã o meu pai, muito sábio, convidou-me a dar um passeio no bosque.
Deteve-se subitamente numa clareira e perguntou-me:
- Além dos pássaros, ouves mais alguma coisa?
Apurei os ouvidos e respondi:
Estou a ouvir o barulho de uma carroça.
- Isso mesmo, disse o meu pai, de uma carroça vazia.
Perguntei-lhe:
- Como sabe que está vazia, se ainda a não vimos?
- Ora, é fácil! Quanto mais vazia está a carroça, maior é o barulho que faz.
Cresci e hoje, já adulto, quando vejo uma pessoa a falar demais, aos gritos, tratando o próximo com absoluta falta de respeito, prepotente, interrompendo toda a gente, a querer demonstrar que só ele é dono da verdade, tenho a impressão de ouvir a voz do meu pai a dizer:
- Quanto mais vazia a carroça, maior é o barulho que faz!

(Autor desconhecido - Retirado de um PPS)

sábado, 6 de julho de 2013

SEMPRE COM A CASA ÀS COSTAS


Sou de todos os lugares
e não pertenço a nenhum
Passeio devagar
para assim não escorregar
no granito do povoado
onde as sombras me protegem

Devagar eu vou ao longe
sem pressas
nem velocidades
com a minha casa às costas
faço parte da paisagem

Caracol
Sou caracol
Com os corninhos ao sol

sexta-feira, 5 de julho de 2013

quinta-feira, 4 de julho de 2013

QUEM SOU EU, afinal?


Chegaram à baía os galeões 
Com as sete Princesas que morreram. 
Regatas de luar não se correram... 
As bandeiras velaram-se, orações... 

Detive-me na ponte, debruçado, 
Mas a ponte era falsa - e derradeira. 
Segui no cais. O cais era abaulado, 
Cais fingido sem mar à sua beira... 

- Por sôbre o que Eu não sou há grandes pontes 
Que um outro, só metade, quer passar 
Em miragens de falsos horizontes - 
Um outro que eu não posso acorrentar... 

Mário de Sá-Carneiro, in 'Indícios de Oiro'

quarta-feira, 3 de julho de 2013

A POESIA É UMA PÁ DE MUITAS FORMAS



A solução para tudo deveria estar na poesia. Não na fuga, no êxodo de si e da decisão, mas no espaço que ela abre no mundo. A poesia é uma pá de muitas formas: suave, áspera, metálica, com desenhos na ferrugem. Serve para nos levar da confusão à luz. Quem decide o destino dos nossos impostos, da educação dos nossos, da forma que o país que habitamos poderia tomar, no curto prazo, deveria ser escolhido pela via poética. Ou seja, alguém que acreditasse na possibilidade de o Homem se transcender. Alguém que quisesse levar o seu povo mais longe, pela multiplicação da riqueza que cada pessoa carrega...
Em vez disso, vamos, por medo, buscar o seu contrário: os medíocres que nos asseguram que só com passinhos de beata se chega ao céu, os manipuladores que garantem só haver uma forma de fazer as coisas, os mais reles de entre nós, de quem a Beleza e a Bondade se riram, porque não acreditamos que o Melhor possa triunfar. Porque raramente acreditamos no melhor que há em nós. E queremos ver um espelho disso mesmo: o triunfo seguro do mais básico.

via facebook

A PONTE POR BAIXO DA PONTE


A ponte une e espera por quem ali passa
sossegada
desperta durante a madrugada
com os passos dos caminhantes perdidos
observa
a companheira afastada que trepida
movimentada 

A ponte une e espera por quem ali passa
e a destrói
porque os heróis deixaram de existir
e a dor é mais forte que a esperança
nestes dias cansados




terça-feira, 2 de julho de 2013

O PASTOR


Pastor do Monte, Tão Longe de MimPastor do monte, tão longe de mim com as tuas ovelhas 
Que felicidade é essa que pareces ter — a tua ou a minha? 
A paz que sinto quando te vejo, pertence-me, ou pertence-te? 
Não, nem a ti nem a mim, pastor. 
Pertence só à felicidade e à paz. 
Nem tu a tens, porque não sabes que a tens. 
Nem eu a tenho, porque sei que a tenho. 
Ela é ela só, e cai sobre nós como o sol, 
Que te bate nas costas e te aquece, e tu pensas 
noutra cousa indiferentemente, 
E me bate na cara e me ofusca. e eu só penso no sol. 

Alberto Caeiro, in "Poemas Inconjuntos" 
Heterónimo de Fernando Pessoa

segunda-feira, 1 de julho de 2013

...De FARDAS NOVAS VEM O SOLIDÓ



Tocam os sinos da torre da igreja,
Há rosmaninho e alecrim pelo chão.
Na nossa aldeia que Deus a proteja!
Vai passando a procissão.
Mesmo na frente, marchando a compasso,
De fardas novas, vem o solidó.
Quando o regente lhe acena com o braço,
Logo o trombone faz popó, popó.
Olha os bombeiros, tão bem alinhados!
Que se houver fogo vai tudo num fole.
Trazem ao ombro brilhantes machados,
E os capacetes rebrilham ao sol.
Tocam os sinos na torre da igreja,
Há rosmaninho e alecrim pelo chão.
Na nossa aldeia que Deus a proteja!
Vai passando a procissão.
Olha os irmãos da nossa confraria!
Muito solenes nas opas vermelhas!
Ninguém supôs que nesta aldeia havia
Tantos bigodes e tais sobrancelhas!
Ai, que bonitos que vão os anjinhos!
Com que cuidado os vestiram em casa!
Um deles leva a coroa de espinhos.
E o mais pequeno perdeu uma asa!
Tocam os sinos na torre da igreja,
Há rosmaninho e alecrim pelo chão.
Na nossa aldeia que Deus a proteja!
Vai passando a procissão.
Pelas janelas, as mães e as filhas,
As colchas ricas, formando troféu.
E os lindos rostos, por trás das mantilhas,
Parecem anjos que vieram do Céu!
Com o calor, o Prior aflito.
E o povo ajoelha ao passar o andor.
Não há na aldeia nada mais bonito
Que estes passeios de Nosso Senhor!
Tocam os sinos na torre da igreja,
Há rosmaninho e alecrim pelo chão.
Na nossa aldeia que Deus a proteja!
Já passou a procissão.

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