A Lenda da Costureirinha
Entre as crenças que algum dia existiram no Baixo
Alentejo, a da costureirinha era uma das mais conhecidas. Não é difícil, ainda
hoje, encontrar pessoas de alguma idade, e não tanta como isso... que ouviram a
costureirinha. O que se ouvia, então? Segundo diversos testemunhos, ouvia-se
distintamente o som de uma máquina de costura, das antigas, de pedal, assim
como o cortar de uma linha e até mesmo, segundo alguns relatos, o som de uma
tesoura a ser pousada. Um trabalho de costura, portanto. O som trepidante da
máquina podia provir de qualquer parte da casa: cozinha, quarto de dormir, a
casa de fora, e até mesmo de alpendres. De tal modo era familiar a sua presença
nos lares alentejanos que não infundia medo. Era a costureirinha.
Mas quem era ela? Afirma a tradição que se tratava de
uma costureira que, em vida,
costumava trabalhar ao domingo, não respeitando,
portanto, o dia sagrado. É esta a versão mais conhecida no Alentejo. Outra
versão afirma que a costureirinha não cumprira uma promessa feita a S.
Francisco. Esta última versão aparece referenciada num exemplar do Diário de Notícias
do ano 1914 em notícia oriunda de aldeias do Ribatejo. Pelo não cumprimento dos
seus deveres religiosos, a costureirinha for a condenada, após a morte, a errar
pelo mundo dos vivos durante algum tempo, para se redimir. No fundo, a
costureirinha é uma alma penada que expia os seus pecados, de acordo com a
crença que os pecados do mundo, o desrespeito pelas coisas sagradas e,
nomeadamente, o não cumprimento de promessas feitas a Deus ou aos Santos podiam
levar à errância, depois da morte. Já não se houve, agora, a costureirinha?
Terminou já o seu fado, expiou o castigo e descansa em paz? A urbanização
moderna, a luz eléctrica, os serões da TV, afastaram-na do nosso convívio.
Desapareceu, naturalmente, com a transformação de uma sociedade rural arcaica, que
tinha os seus medo, os seus mitos, as suas crenças e o seu modo de ser e de
estar na vida.
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