PALAVRAS de 1 de
Janeiro:
"O coração dos
homens transforma-se ao sentir-se poderoso. O poder é um veneno que cega e
destrói, que chega de dentro e de cima e vira tudo do avesso. Deixamos de ser
quem somos e perdemo-nos como numa tempestade de areia. Ficamos imprudentes
e obcecados ao manipular essa arma imaterial."
"- Life, sometimes, fucking hurts, but it´s all we have. I feel
safe with you, and I hope you feel safe with me, too. Look, here I am, crying,
because I know you are going to disappear from my life, again. Where are you
now? Do you really know where you are?"
PALAVRAS de 2 de
Janeiro:
"Jorge andou a pé
toda a manhã. Foi a mais
perfeita das manhãs de sua vida. A ponte é
majestosa e andar por ela, sentir-lhe as vibrações nos ossos e na pele, era
tudo o que sempre sonhara. Olhar a cidade lá do
alto é outra coisa, e nem o trânsito
infernal o conseguiu incomodar.
O menino imaginou a
construção sem viaturas e sem aquele zunido constante que faz lembrar milhares
de enxames de abelhas prontas a atacar."
- Tu, … tu foste
sozinho, a pé, até à ponte sobre o Tejo, Jorge? É mesmo isso que me estás a
dizer? Tu fazes ideia dos perigos tremendos por que passaste?
Tens certeza de que não
me está a mentir, Jorginho?
- Sim, professora, é
mesmo verdade! Depois começou a chover muito e ainda pensei voltar para trás,
mas ficou melhor e continuei. Não é assim tão longe, e o passeio é muito, muito
bonito."
PALAVRAS de 3 de
Janeiro:
"Como seria voltar
atrás no tempo, sermos capazes de ser vários eus ao mesmo tempo?
Dizem-nos que o
universo marcha a diferentes velocidades, portanto...
Poderíamos habitar universos paralelos, o que fica do
outro lado da ponte ou aquele outro do lado
de lá da avenida. Num outro universo,
optaria por ser escritor, um que não estivesse muito próximo deste, ao ponto de
com ele ser confundido."
Proposta: Digam lá, por
favor, se pudessem voltar
atrás no tempo, e habitar num qualquer outro universo, onde é que este ficaria,
e o que é que por lá andariam a fazer?
PALAVRAS de 4 de
Janeiro:
A vida, de um momento
para o outro, pode ficar toda lixada.
Confiamos nas pessoas e elas acabam sempre por nos desapontar. É a natureza humana, a natureza das coisas.
Confiamos nas pessoas e elas acabam sempre por nos desapontar. É a natureza humana, a natureza das coisas.
A vida diverte-se a
gozar connosco, descaradamente,
manipula-nos e engana-nos.
E as promessas de amor
são muito perigosas, são perigosas e fazem mais vítimas que os acidentes
rodoviários. Ferem, matam mais que mil punhais.
Afinal, o que é isso do
amor?
É, como dizia o poeta,
aquilo que cada um sente:
"Quem quer dizer o
que sente
Não sabe o que há de
dizer.
Fala: parece que
mente...
Cala: parece
esquecer..."
"O amor é a altura
em que nos confrontamos com a existência real dos outros".
PALAVRAS de 5 de
Janeiro:
A vida tem mente própria.
As pessoas costumavam
interessar-se com o que acontecia no mundo, mas agora, tudo está desajustado.
Talvez o universo ainda não tenha aprendido a andar de bicicleta e tenha dado
um valente trambolhão. É
imprudente pedalar a esta velocidade no inverno, com esta chuva e este gelo.
O universo sofreu alguns reveses, desmaiou,
desapareceu por algum tempo. Só assim se justifica o que se tem andado a
passar. Ansiedade, euforia, agitação, escutar vozes sem nenhum motivo, apenas
porque estas se lembram de aparecer, tal como nascem buracos negros que dão à
luz milhões de estrelas, ou as engolem, a elas e ao tempo, e depois param, e
voltam a saltar, e de novo a parar.
O universo deve estar
escondido do outro lado da parede à espera que alguém escreva uma história
acerca dele, e explique como funciona.
Ninguém o conhece,
verdadeiramente.
Somos o infinitamente
grande, e o pequeno.
PALAVRAS de 6 de
Janeiro:
- Isto deve ser um
sonho! - diziam-lhe as vozes. – Tu estás bem, mas és um homeless. – voltavam a repetir.
Todos têm direito a uma
história, porque será que ninguém escreve histórias acerca de um sem-abrigo?
Daniel queria ser músico. Os seus olhos
negros fixavam-se na pauta até lhe doerem as pernas e os dedos de tanto tocar.
Tocava sempre, em todos os lugares, todos os dias, e queria mudar o mundo com a
sua música. Como é hábito neste universo violento, um gigantesco buraco negro
preparava-se para o engolir, e ele a lutar como um leão, a fingir tocar as
notas no seu corpo.
Daniel limpava as sujidades dos túneis, apanhava e limpava as beatas do chão, limpava as ruas, a cidade, limpava o mundo, o universo, e depois tocava. Fechava os olhos e tocava. A música ecoava pelos túneis por onde os carros passavam sem nunca parar. Ali estava ele com a sua música. Para onde ia, Daniel, quando fechava os olhos e tocava? O universo parava, as pombas levantavam voo, o caos era o mesmo. As notas ecoavam pelas galerias por onde o trânsito fluía, e o universo retomava o seu passo. Confirmava, a cada dia, que era um local sujo e violento, caótico, insano e assustador.
Daniel, enquanto tocava, gostava de olhar para os olhos dos outros. Andava estafado, e o cérebro cansado apenas tinha um lugar iluminado, o lugar onde as vozes o confortavam, o lugar certo. Dizia sempre estar à espera da pessoa que lhe iria curar a doença.
Daniel limpava as sujidades dos túneis, apanhava e limpava as beatas do chão, limpava as ruas, a cidade, limpava o mundo, o universo, e depois tocava. Fechava os olhos e tocava. A música ecoava pelos túneis por onde os carros passavam sem nunca parar. Ali estava ele com a sua música. Para onde ia, Daniel, quando fechava os olhos e tocava? O universo parava, as pombas levantavam voo, o caos era o mesmo. As notas ecoavam pelas galerias por onde o trânsito fluía, e o universo retomava o seu passo. Confirmava, a cada dia, que era um local sujo e violento, caótico, insano e assustador.
Daniel, enquanto tocava, gostava de olhar para os olhos dos outros. Andava estafado, e o cérebro cansado apenas tinha um lugar iluminado, o lugar onde as vozes o confortavam, o lugar certo. Dizia sempre estar à espera da pessoa que lhe iria curar a doença.
Era muito raro ele
aparecer mais do que duas vezes no mesmo local, mas a sua música encontrava
toda a gente, invadia todos os espaços, mesmo aquele que se encontrava atrás da
parede onde o cosmos gostava de se esconder. Ele alcançava-o, e era assustador.
As suas vozes nem sempre eram amigas.
A rua não é lugar para
ele, a rua não é lugar para ninguém.
PALAVRAS de 7 de
Janeiro:
“Somos mortais
Todos iremos partir
Todos iremos morrer
aqui na Terra
Como uma pintura
Todos seremos apagados
Como uma flor
Nos iremos secando
Meditem, senhores
águias e jaguares
Nem que sejam de jade
Nem que sejam de ouro
Também para lá
partireis
Para o lugar dos
descansos
Temos que despertar
Nada haverá de ficar”
.
Nezahualcoyotl – rei e
poeta asteca de Tezcoco ( 1402 – 1472 )
PALAVRAS de 8 de
Janeiro:
O universo é
inconstante, chega mesmo a parecer absurdo. Todas as galáxias se afastam e o
imenso lençol onde se aninham também cresce a uma velocidade inimaginável. Um
poderosíssimo buraco negro atrai para as profundezas do universo o próprio universo
onde o buraco negro habita, tornando ainda mais complexa a compreensão desse
fenómeno. A luz do universo em expansão perde intensidade, tal como as ondas que
surgiram nesse longínquo instante inicial.
O brilho das estrelas
que conseguimos observar é um brilho sortudo e mentiroso. Conseguiu chegar até
ao nosso firmamento, ao contrário da luz de tantas outras. As estrelas e
galáxias que avistamos são as mais jovens, e as que estão mais próximas de nós.
Algumas delas já pereceram, e como a morte é escura, à noite, também o céu se
tornou escuro. Filamentos
de triliões de estrelas unem as galáxias umas às outras. É uma rede, a maior de
todas as redes, mas também ela já mudou, e tudo se tornará mais sombrio.
É nesse horizonte
longínquo, que tudo aquilo que imaginamos e compreendemos acabará pura e
simplesmente por desaparecer
PALAVRAS de 9 de
Janeiro:
Sigo na direção da Rua Voz do Operário, sem saber para onde ir, mas depressa me deixo apanhar pelo frenesim que chega do Campo de Santa Clara. A feira está montada desde bem cedo, como é costume. A feira está sempre montada, terças e sábados, para que tudo se venda e tudo se possa comprar. Lanço a vista pelos faqueiros de prata, e salto para os espelhos e as botas de marca já gastas de tanto uso. Ali ao lado estão rádios antigos, coleções de perucas colocadas em bustos aveludados, bonecas de porcelana da china, coleções de máquinas fotográficas e fotografias de vidas de outros. Mais abaixo encontro malas e malinhas de mão decoradas com imagens de estrelas de cinema dos anos cinquenta e sessenta, candeeiros e lustres de teto, instrumentos musicais, relógios de pulso, de mesa, de bolso, de parede e de cuco, relógios despertadores, gramofones, discos antigos, pinturas, móveis de época, bonecas de porcelana, bonecas de trapos, mais calçado, chapéus e todo o tipo de vestuário. Um velho senhor de pele marcada tenta vender livros, muitos livros, e estatuetas africanas que jazem abandonadas no meio de peças de joalharia. O homem da concertina vai tocando perto de uma banca onde moedas, selos e postais convivem com brinquedos antigos de madeira e outros mais recentes de plástico e de metal. Aqui negoceia o homem das ferramentas, acolá, o homem dos sete instrumentos, que também entende de cromos e de cadernetas do século passado. Depois há trajes e roupas do tempo das grandes guerras, vizinhas de máquinas de escrever e de costurar. Duas senhoras vendem caixas de garrafas de espumante e garrafões de vinho branco e vinho tinto. Passo algum tempo a apreciar duas câmaras de filmar, e vasculho numa caixa de cassetes de áudio e de vídeo. Um casal de idosos tem anéis, pulseiras, brincos e muitos colares para vender. Numa mesa instável, dois turistas ingleses olham para tinteiros enquanto pagam as canetas. Também ali há botões, maçanetas de portas e óculos para todos os gostos, e o povo lá vai procurando, vendendo, regateando, e ainda nem bateram as dez da manhã.
PALAVRAS de 10 de Janeiro:
Viver.
Um dia de cada vez.
Estar atento a todos os
silêncios.
Estar atento a cada
palavra, a cada gesto.
Ficar atento a cada som
e melodia.
O passado erigiu muros
bem altos, grossos e negros, muros que separaram os homens uns dos outros,
construídos com o intuito de os destrinçar, muros invisíveis criados pelos que
se julgavam bem mais e bem melhor. Desse passado ainda nos chegam trágicas descobertas,
reflexos viscosos de ideais, de filosofias mesquinhas, decadentes, doentias.
Há sonhos e pesadelos
tão reais, tão capazes de nos mudar para sempre.
Há sonhos, e pesadelos, e realidades de sonho e pesadelo, doces e amargas, neste universo desconhecido onde existimos minúsculos, invisíveis, irreais.
Há sonhos, e pesadelos, e realidades de sonho e pesadelo, doces e amargas, neste universo desconhecido onde existimos minúsculos, invisíveis, irreais.
Que histórias consegue
o escritor roubar à vida?
O que leva o escritor a
escrever?
Procura sentido nas
memórias, nos sonhos, naqueles poemas de tempos
perdidos que se
entretém a resgatar.
O escritor escuta,
e vive um dia de cada
vez.
PALAVRAS de 11 de
Janeiro:
O pai de Jorge sempre
lhe disse que era proibido passear a pé pela ponte. Ele gosta quando o pai lhe
diz que não se pode, vai logo experimentar para ver se é verdade.
A mãe nunca lhe diz que
não se pode. Certo dia
ficou com as mãos todas sujas de terra por ter andado a brincar no campo com os
amigos. Jorge perguntou-lhe se podia pintar as paredes do quarto com aqueles
dedos acastanhados, e ela disse-lhe que sim, que devia experimentar tudo aquilo
de que gostasse, e que devia fazer um pouco de todas as coisas. A mãe não se
importou, mas o pai não gostou. Os dois nunca se entenderam lá muito bem, ao
contrário dos avós. A
parede ficou fantástica!
Jorge é um rapaz que
gosta de dormir, e gosta muito de acordar depois de dormir. Gosta de pular e de
correr, gosta de fazer perguntas complicadas ao pai, gosta de andar descalço
pela terra e pela areia, gosta de saltar da prancha mais alta da piscina, de
fazer bolas de sabão e de ver desenhos animados. Também gosta de ver aqueles
macacos pequenitos que andam à solta, no jardim zoológico, por entre os
visitantes.
Jorge não gosta, nem um
bocadinho, de secar o cabelo, não gosta de cães que ladrem muito alto e não ama
multidões. Tão pouco aprecia ver os pássaros fechados em gaiolas ou que o pai
lhe esteja sempre a dizer que não se pode andar a pé na ponte sobre o Tejo.
Gostava, um dia, de vir
a ser paraquedista. Quer aprender a confecionar o melhor pão do mundo, ou então
aprender a ser pastor, e deseja mesmo muito que os pais não passem os dias
sempre a discutir. Mas o que ele gostaria mais do que tudo na vida era que a
sua mãe não estivesse sempre tão doente.
Os maiores desejos são
quase sempre acerca de coisas bem pequenas, mas tão difíceis de concretizar...
PALAVRAS de 12 de
Janeiro:
Os olhos estão abertos,
os olhos estão fechados.
Uma vez a doença
espalhada, a vida fica suspensa, até acabar, até melhorar. Tirá-la do corpo,
derrotá-la antes que nos vença, tão perto e contudo tão longe. Nada nem ninguém consegue derrotar o poder da
morte, apenas adiá-la, esse é o único plano possível.
Promessas, um médico promete, o doente acredita ou
faz por acreditar, é a esperança que prevalece, não as palavras.
O que farias para poder
vencer essa maldita doença, poder adiar a morte uma, e outra vez?
- Está tudo bem,
doutor, eu sei. É inoperável. Não se preocupe, o senhor não ia acreditar se eu
lhe dissesse o que consigo ver neste momento. – explicou-lhe uma vez um
paciente. - Todos estamos destinados a fazer aquilo para o qual nascemos. Fazer
coisas maravilhosas. Transformar o mundo num lugar melhor, e nunca nos
esquecermos de onde viemos, para que nunca nos esqueçamos para onde iremos
regressar.
E o País, ainda haverá
tempo para o salvar?
PALAVRAS de 13 de
Janeiro:
Quando a folha vazia
ameaçava, mais uma vez, vencer a misteriosa habilidade do escritor, eis que da
sua caneta começaram a dançar letras azuis que se ordenavam em palavras nas
linhas do caderno onde as guardava. As
histórias escolheram-no, era ele quem as teria de divulgar custasse o que
custasse. O que mais lhe dificultava a tarefa era a existência desse caos
aleatório que o rasteirava a cada tentativa de fazer avançar a escrita. As
palavras escolheram-no sem avisar. De um momento para o outro começou a
escrever aquela primeira história que sozinha cresceu e passou a fazer parte de
si.
Desde então nunca mais
deixou de fazer esse exercício estranho. Não se sentia dono das histórias que
construía, apenas um obreiro, apenas o artífice que escutava e transcrevia, um
artesão que ouvia e depois moldava tudo o que lhe foi contado.
O que te impede de
escrever?
Nada
Então escreve o que em
ti existe ...
como se não houvesse
amanhã.
PALAVRAS de 14 de
Janeiro:
O tempo passa depressa,
demasiado depressa.
Onde foi que se
esconderam tantos anos?
Augusto recorda os dias
distantes da sua juventude, na aldeia transmontana onde nasceu, cresceu, e se
fez homem.
A vida é madrasta, e nem sempre acolhe como o Cristo redentor.
Augusto está esgotado, farto de emoções, cansado de desilusões.
A vida é madrasta, e nem sempre acolhe como o Cristo redentor.
Augusto está esgotado, farto de emoções, cansado de desilusões.
- Sinto que não fui um
bom pai. Estou convencido que não fiz tudo aquilo que estava ao meu alcance
para que vocês fossem felizes. Esta vida de merda passa tão depressa, mais
parece uma ilusão. Andamos enganados, deixamo-nos enganar como criancinhas
inocentes e quando damos conta, a vida passou por nós e não fizemos nada
daquilo que sonhámos. Merda, a vida é uma grandessíssima merda, essa é que é
essa!
- Foi ontem! - pensa
Augusto - Foi só ontem que tudo se passou.
- O que o avô está a
dizer, é bem verdade! O tempo passa a correr. Devíamos dar mais atenção às
coisas que verdadeiramente importam, e há alturas na vida em que se torna mais
dolorosa esta evidência. Por mim, o avô pode dizer todas as asneiras que lhe
vierem à cabeça. Esteja à vontade, avô, força, desembuche para aí à vontade! -
responde-lhe o neto mais velho.
Augusto sorri,
contempla o neto olhos nos olhos, e exclama:
- Tu vê lá se ganhas juízo, Joel. Aproveita bem o que a vida tem para te oferecer, e goza-a bem! Olha que isto passa tudo num instante, num abrir e fechar de olhos, e a maior parte das vezes só nos preocupamos com merdices sem importância nenhuma. Goza agora, goza bem tudo o que de bom a vida tem para te dar.
- Tu vê lá se ganhas juízo, Joel. Aproveita bem o que a vida tem para te oferecer, e goza-a bem! Olha que isto passa tudo num instante, num abrir e fechar de olhos, e a maior parte das vezes só nos preocupamos com merdices sem importância nenhuma. Goza agora, goza bem tudo o que de bom a vida tem para te dar.
CARPE
DIEM!!!!!!!
PALAVRAS de 15 de Janeiro:
As bombas continuam a
cair.
Sem aviso prévio,
alguém começa a disparar no escuro.
O homem está deitado,
sem escutar, só cheira, e observa os clarões provocados pelas rajadas dos
atiradores. Onde estarão escondidos?
O homem quase não vê, e
ficou surdo desde que voou projetado pelo impacto das bombas.
Os atiradores são como fantasmas, sombras de um
outro mundo. Estas vidas escondem histórias
extraordinárias, porque todas as vidas são excecionais.
Tudo em Aleppo parece
mover-se em câmara lenta. As balas atravessam o ar, cruzam-se em diferentes
direções, embatem com violência nas carcaças destroçadas dos edifícios,
penetram tapumes de contraplacado e gesso, furam tetos falsos, carros
destruídos e perfuram os cadáveres que se encontram ao seu lado.
O homem continua surdo,
mas já consegue vislumbrar. Está deliciado com o voo das balas em câmara lenta.
Traçam perfeitas linhas luminosas na escuridão da cidade arrasada.
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